quinta-feira, 15 de novembro de 2007

A ESCULTURA DE SI (TRECHO)

DA PRODIGALIDADE OU O EXCEDENTE SUNTUÁRIO

A prodigalidade é uma virtude de artista. Ela me fascina tanto quanto a avareza e a economia me desagradam. Aliás, poder-se-ia definir o burguês como o ser radicalmente incapaz de gastar sem que seja destruído pelo arrependimento ou atormentado pelo remorso. A resipiscência o arruína assim que se separa dos seus ducados e ele não conhece outro jeito de se redimir senão retornando ao trabalho, sempre e sempre. Acumular, diz ele, entesourar, ter e possuir: ele não pára de amontoar, confeccionar tesouros e calcular dividendos ou lucros. Sua alma é a de um contador, ele sonha, à noite, com livros-caixas e com fortunas, carteiras de ações e ricos rendimentos.
Só sinto desdém pela parábola dos talentos e o filho pródigo me agrada principalmente quando ele dilapida. O agiota, o banqueiro, o gerente, o economista são figuras compassadas da burguesia que se definiu pelo que ela tem – visto
que ela é unicamente o que possui. Mas o fato é que vivemos uma época essencialmente dominada por essa gente. Desejo para essa corja uma geografia aparentada às regiões utópicas de Thomas More, onde o ouro serviria para a fabricação de penicos e de correntes com as quais se prendem os escravos. Como triunfou Lênin ao anunciar que a vitória da revolução bolchevique seria total no dia em que, cobrindo o conjunto do planeta, ela permitiria, conforme seus desejos, construir urinóis públicos em ouro nas ruas das maiores cidades do mundo! É chegada a hora do triunfo, já pressentido por Baudelaire, do dinheiro dos burgueses sobre a imaginação dos poettas. Com o apreciador de paraísos artificiais, conspurquemos a época que permite aos ricos se servir de poeta assado em cada um de seus almoços. No entanto, não sacrifiquemos aos tempos ultrapassados os amanhãs que cantam e revoluções para
um futuro brilhante.

TRATADO DE ATEOLOGIA (TRECHO)

A CONSTRUÇÃO DE JESUS

1 Histórias de falsários
Evidentemente Jesus existiu – assim como Ulisses e Zaratustra, e pouco importa saber se viveram fisicamente, em carne e osso, numa época precisa num lugar identificável. A existência de Jesus não é de modo nenhum comprovada historicamente. Nenhum documento contemporâneo do acontecimento, nenhuma prova arqueológica, nada de certo permite concluir hoje pela verdade de uma presença efetiva na articulação dos dois mundos abolindo um, nomeando o outro.
Não há túmulo, não há sudário, não há arquivos, com exceção de um sepulcro inventado em 325 por santa Helena, mãe de Constantino, muito dotada, pois também se deve a ela a descoberta do Gólgota e a do titulus, pedaço de madeira que traz o motivo da condenação. Um pedaço de tecido que a dataçâo por carbono 14 atesta datar do século XIII de nossa era e que só um milagre poderia fazer com que envolvesse o corpo de Cristo mais de mil anos antes do cadáver putativo! Finalmente, três ou quatro vagas referências muito imprecisas em textos antigos – Flávio Josefo, Suetônio e Tácito –, certamente, mas em cópias feitas alguns séculos depois da suposta crucificação de Jesus e principalmente bem depois do sucesso de seus turiferários...


Temos a obra completa (em espanhol) na Biblioteca dos VEFs (Sub pasta ONFRAY)

Deus, um delírio (trecho)

A Hipótese de que Deus Existe

A religião de uma era é o entretenimento literário da seguinte. Ralph Waldo Emerson

O Deus do Antigo Testamento é talvez o personagem mais desagradável da ficção: ciumento, e com orgulho; controlador mesquinho, injusto e intransigente; genocida étnico e vingativo, sedento de sangue; perseguidor misógino, homofóbico, racista, infanticida, filicida, pestilento, megalomaníaco, sadomasoquista, malévolo. Aqueles que são acostumados desde a infância ao jeitão dele podem ficar dessensibilizados com o terror que sentem. Um naif dotado da perspectiva da inocência tem uma percepção mais clara. Randolph, filho de Winston Churchill, conseguiu – não sei como – permanecer ignorante em relação às Escrituras até que Evelyn Waugh e um irmão soldado, na vã tentativa de manter Churchill quieto quando eles estavam no mesmo destacamento, apostaram que ele não seria capaz de ler a Bíblia inteira em quinze dias: “Infelizmente isso não surtiu o efeito que esperávamos


Veja a versão completa na Biblioteca dos VEFs, sub pasta "MISCELÂNEA"

terça-feira, 13 de novembro de 2007

NOSSO PRIMEIRO POETA

Nosso primeiro poeta divulga seu trabalho mas prefere que apenas seu talento apareça e por isto mantém sua identidade no anonimato. Apenas posso divulgar que é um dos nossos amigos VEF.








DÓI SER GENTE.

Dói ser gente.
Dói estar montado na corcova do mundo.
Dói, meu rapaz!
Já contei-lhe da vez que me tornei num bruto?
Ah, meu rapaz! Foi um desastre!
Minha brutalidade não ultrapassou o primeiro rosto
a me fitar sem esperança.
O problema são as lágrimas, meu rapaz,
são essas inoportunas que, anacrônicas,
descompõem-me frente aos meus ordenanças;
E eu sempre as dissimulo,
mas nisto é que consiste a descompostura...
Se ao menos o mundo fosse um puro sangue!
Mas é uma corcova, meu rapaz,
é uma corcova dum camelo morto de sede.
Aquele meu camarada do qual esqueci o nome...
Acho que cultivava batatas ou rabanetes (não sei bem).
Pois bem, meu rapaz,
hoje ele pesca camarões.
Uma vez eu lhe perguntei se era feliz;
não me falta nada, disse ele
por detrás dum nariz avermelhado.
E havia tanto sal em seu olhar
que pus os óculos.

06/jun. rzk.a

NOVO ESPAÇO PARA NOSSOS POETAS




Estamos disponibilizando este espaço para nossos associados publicarem suas obras literárias.
Participem! Enviem suas poesias, crõnicas, contos, aforismos, reflexões, arquivos em Power Point, desenhos, fotos etc...